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terça-feira, 19 de março de 2013

DEPOIS DA SEMANA DE 22: A BUSCA DA IDENTIDADE. (3º ano do Ens. Médio).


A SEMANA DE ARTE MODERNA

A Semana de Arte Moderna de 1922 foi um momento de ruptura que dividiu a arte brasileira entre academicismo e modernismo. Não foi, porém, uma unanimidade nacional e gerou acirradas controvérsias entre as duas facções artísticas. De um lado, os acadêmicos defendendo sua estética como representativa de estilo que perdurava entre nós desde a chegada da Missão Artística Francesa ao Brasil, em 1816, com plena aceitação por parte da sociedade da época. Já os modernistas, imbuídos de espírito renovador e revolucionário, lutavam para impor linguagens que se incorporaram à arte mundial desde os impressionistas que, a partir de 1874, mudaram a história da pintura. Seus reflexos, porém, ainda não haviam chegado ao Brasil.
Na verdade, existia um artista, Eliseu Visconti (1866-1944), que além de pintor de grandes méritos, demonstrara afinidades com outras linguagens, como o Art Nouveau que predominou naEuropa de 1890-1910, principalmente no mobiliário e objetos utilitários, através de peças decorativas, na verdade as primeiras criadas por um artista brasileiro a nível industrial. Um pioneiro, portanto, do que mais tarde seria conhecido como Desenho Industrial.
Mas onde Visconti inovou mesmo foi na execução das pinturas do foyer do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, em 1913, que conclui em 1916, sendo considerada uma de suas obras-primas. Anteriormente (1908), o artista já havia pintado o pano- de-boca da mesma casa, tendo comotema A Influência das Artes na Civilização, causando grande controvérsia.
Nas pinturas do teto e das paredes do Theatro Municipal, uma grande realização do então prefeitoPereira Passos, Eliseu Visconti empregou pela primeira vez as pinceladas impressionistas entre nós, pinturas de efeitos diáfanos, de cores suaves, nas quais contou, entre outros colaboradores, com os pintores Marques Jr. e Henrique Cavalleiro. Esse último, posteriormente, viria a se casar com a filha do mestre, Ivone Visconti Cavalleiro, que se revelaria igualmente excelente pintora dentro dos mesmos cânonespreconizados pelos pintores franceses nos meados do século 19.
Ressalte-se ainda que outros pintores brasileiros ligados ao academicismo e à Escola de Belas Artes, como Georgina de Albuquerque, Almeida Jr., Batista da Costa, Belmiro de Almeida (autor da pintura Mulher em Círculos, datada de 1921, com preocupações cubistas) e Marques Junior, entre vários outros, já encaminhavam seus trabalhos para o impressionismo.

O fato, porém, de estarem veiculados à Escola Nacional de Belas Artes, como antigos alunos e professores, talvez seja a razão pela qual não foram sondados para se alinharem aos seus colegas do movimento paulista de 1922 na procura de atualizar a arte brasileira em relação às linguagens que já se espalhavam mundo afora.

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Os artistas que participaram do evento modernista que movimentou a capital paulista entre 11 e 16 de fevereiro de 1922, bem que tentaram dar um cunho nacionalista aos seus trabalhos, poucos, no entanto, foram os que responderam ao que se esperava de renovação. A não ser as pinturas da paulistana Anita Malfatti (1889-1964), oscilando entre o expressionismo e o cubismo. A pintora, cujo aprendizado iniciado no Brasil com Pedro Alexandrino, pintor acadêmico, incluía cursos na Alemanha e Estados Unidos com professores como Lovis Corinth e Homer Boss, respectivamente, já antenados com o vocabulário moderno.
Ainda mais porque, em 1913, os Estados Unidos já tinham aderido à pintura contemporânea através da realização do Armory Show, a mega exposição que incluiu obras de Duchamp, Picasso, Picabia, Monet, Cézanne, Archipenko, entre tantos que estavam fazendo a moderna história da pintura.
Por sinal, na exposição de 1922, Anita Malfatti comparecia com as mesmas obras que apresentara anteriormente na sua primeira exposição individual, em 1917, realizada em São Paulo sob o estimulo de Di Cavalcanti, com 53 trabalhos de pintura e gravura, para muitos o estopim da semana modernista.
Sem obter repercussão, ela compartilhava do mesmo desinteresse com que São Paulo recebera, em 1913, a exposição individual de Lasar Segall (1891-1958) no Brasil, um dos criadores do movimento expressionista alemão. Segall, lituano de nascimento, posteriormente voltaria ao Brasil e aqui permaneceria até sua morte.
A mostra de Anita Malfatti só não passou em brancas nuvens devido ao polêmico artigo assinado pelo escritor Monteiro Lobato no jornal O Estado de São Paulo, conhecido como “Paranóia ou Mistificação”. Nele, o criador de Jeca Tatu e um dos mais respeitados escritores nacionais da época, condena as deformações expressionistas da pintora, embora reconhecendo seu talento.
Intelectuais, como Mário de Andrade (1893-1945), cujo ideário nacionalista e incentivador de propostas modernistas em todos os setores da cultura brasileira, por exemplo, aplaudiram as estimulantes inovações da pintora com palavras encorajadoras.
Os demais artistas plásticos convocados a participar da Semana de 22 limitaram-se a mostrar trabalhos sem a inovação que desejavam seus organizadores. Ressalte-se que a identidade nacional preconizada pelos mentores somente aparecia nos trabalhos do pernambucano Vicente do Rego Monteiro, que enveredava por motivos indígenas.
A Semana de Arte Moderna, porém, foi importante foco inicial da discussão em torno da arte no Brasil e seu atraso em relação à arte mundial nos primórdios do século 20. Sem uma tradição, os nossos artistas acadêmicos, quando premiados nos Salões de Arte instituído sob a chancela paternalista do governo imperial na Academia de Belas Artes, viajavam à Europa não em busca de inovações, que nem queriam e nem notavam, porém para aperfeiçoar a técnica, de acordo com a estética do neoclassicismo em voga no país.
Foram os sucessivos movimentos que sucederam ao evento realizado na capital paulista, porém, que abalaram as estruturas de jovens artistas brasileiros. Contando com o apoio de intelectuais, igualmente jovens, eles conseguiram levar adiante as propostas preconizadas por Di Cavalcanti, Mário (1890-1954) e Oswald de Andrade, os mentores da Semana de Arte Moderna. Segundo o poeta Paulo Mendes de Almeida, o movimento 1922 queria abalar as mais díspares criações artísticas do país, desde a música, a literatura, às artes plásticas e foi “um safanão naquele adormecido em berço esplêndido Brasil das Letras, das Artes e do Pensamento”.
Indiscutivelmente, dois manifestos contribuíram para preservar as idéias da semana modernista: Poesia Pau Brasil e Antropofágico, lançados em1924. Oswald de Andrade, paulista de nascimento, que redigiu os manifestos, foi uma das figuras mais controversas e anárquicas do período. Poeta, romancista, crítico, jornalista, escritor, dramaturgo – O Rei da Vela, uma de suas peças é considerada das mais instigantes obras do moderno teatro brasileiro - e, principalmente, agitador no bom no sentido da palavra, já tivera contato na Europa com as transformações que se sucediam no campo das artes e ficara bastante impressionado com as teorias do Futurismo e seus manifestos iconoclastas divulgados a partirde 1909, exaltando a velocidade e os motores como símbolos da arte do nosso tempo, enquanto repudiavam os museus, as bibliotecas e as estatuárias greco-romanas como anacrônicas em relação ao automóvel e ao avião.
À frente do futurismo estava o poeta italiano Filipo Tommaso Marinetti que viajou pelo mundo para divulgar suas idéias, tendo estado inclusive no Brasil, no Rio de Janeiro e São Paulo, em 1926, com certa repercussão nos meios intelectuais. Tanto que por muitos anos futurismo passou a designar no Brasil qualquer manifestação de arte moderna.
Portanto, não é por acaso que os reflexos da Semana de Arte Moderna tenham provocado Oswald de Andrade a buscar novas motivações que não fossem apenas polêmicas mas, sobretudo, que despertassem no artista brasileiro um passo avançado dentro da própria realidade nacional que o cercava.
Nesse particular, a presença da pintora Tarsila do Amaral (1886-1973) foi decisiva.
O primeiro dos manifestos divulgados por Oswald de Andrade, publicado pelo jornal carioca Correio da Manhã, em 18 de março de 1924, propunha uma arte nascida no Brasil e capaz de apreender e expressar as novas realidades urbanas e industriais da cidade, acentuando ainda que Pau Brasil era contrário à cópia, “pela invenção e pela surpresa”.
É bom assinalar que Tarsila não estava em São Paulo quando da realização da semana modernista; dela tomara conhecimento através de correspondência com Anita Malfatti. Mesmo longe do Brasil, a reação de Tarsila não podia ser outra, a não ser de apoio incondicional a esse movimento.
De regresso ao país em 1922, uniu-se a Oswald de Andrade, resultando da união a divulgação do Manifesto Pau-Brasil (1923) que, na verdade, apoiava-se exclusivamente na sua pintura, caracterizada pela busca de motivos brasileiros, neles incluídos a cor caipira e o rigor formal geométrico-cubista. Em Paris, onde passara temporada estudando e expondo, Tarsila tivera como mestres André Lhote, Fernand Léger e Albert Gleizes, três expoentes de novas linguagens na pintura, quando a capital francesa, nosprimeiros anos do século 20, borbulhava de idéias estéticas que tantas influências tiveram na história da pintura.
Pinturas como A Negra, A Cuca, Morro da Favela e Carnaval em Madureira, serviam ao conteúdo do manifesto, que se consolidaria com a viagem de Tarsila a Minas Gerais e ao Rio de Janeiro. Em companhia de Oswald e Mário de Andrade, que nem sequer eram parentes, embora com o mesmo sobrenome, do poeta francês então no Brasil, Blaise Cendrars, Olívia Guedes Penteado,Godofredo da Silva Teles e René Thiollier ela não somente se encantaria com a paisagem e o trabalho de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1730-1814), cuja valiosa obra barroca estava à espera de uma descoberta a nível nacional, como reformularia toda a sua pintura com o que ela denominava cores caipiras: os inusitados tons, como o rosa, principalmente, das fachadas das casas interioranas mineiras. Como ela própria confessava “...encontrei em Minasas cores que adorava em criança. Ensinaram-me depois que eram feias e caipiras. Segui o ramerrão do gosto apurado. Mas depois vinguei-me da opressão, passando–as para as minhas telas...”
O segundo manifesto, denominado Antropofagia, veio a lume em 1928, no mesmo ano que Tarsila do Amaral presenteia Oswald de Andrade, com quem se casara, com a tela O Abaporu, que na linguagem indígena significa antropófago.
Mais uma vez, a pintura da artista paulista, entre 1928-1929, seria o cerne do manifesto. Obras como O Sapo, Urutu, Sol Poente, mostravam Tarsila tendendo ao gigantismo, às deformações, com o lirismo de cores oscilando entre o fantástico e o onírico nas composições.
O Manifesto Antropofágico seria publicado no primeiro número da Revista de Antropofagia, dirigida pelos escritores Antônio de Alcântara Machado e Raul Bopp, ambos de tendência modernista. Ressalte-se que Bopp era o autor do célebre poema Cobra Norato, um dos marcos da nova poesia brasileira.
Entre outras coisas, o Manifesto proclamava: - Só o antropofagismo nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente; Tupy or not tupy, that the question; Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago; Nunca fomos catequizados. Fizemos foi o carnaval; O índio vestido de senador do Império. Fingindo de Pilt, ou figurando nas óperas de Alencar cheios de bons sentimentos portugueses.
O manifesto era datado de Piratininga, Ano 374 da deglutição do Bispo Sardinha. Uma alusão em tom gozativo ao célebre episódio da história do Brasil sobre a captura e morte do 1º Bispo do Brasil, trucidado pelos indígenas na costa brasileira.

DI CAVALCANTI, PORTINARI, ISMAEL NERY

Três pintores deram valiosa contribuição à consolidação dos ideais modernistas no Brasil. São eles: Emiliano Di Cavalcanti (1897-1976), Cândido Portinari (1903-62) e, isoladamente, Ismael Nery (1900-1934).
Grande incentivador da renovação da arte brasileira, Emiliano Di Cavalcanti, ideólogo da Semana de Arte Moderna de 1922, um ano após a sua realização, viajou para Paris em busca de novos horizontes. Na capital francesa, entre a pintura e o estudo (na Academia Ranson), freqüentou os ciclos boêmios e intelectuais locais integrados por músicos, poetas e artistas plásticos.
Um deles, Pablo Picasso, teria grande influência na obra futura de Di Cavalcanti, por ele mesmo confessada.
Em 1924, o pintor nascido no Rio de Janeiro, no bairro de São Cristóvão, regressa ao Brasil para iniciar uma das mais fundamentais obras da arte brasileira de todos os tempos. Principalmente porque unia os conhecimentos técnicos absorvidos durante a estada parisiense e em visita aos grandes museus, conseqüentemente, em contato com os mestres da pintura, a uma noção de brasilidade rara num artista nacional da época.

“Di Cavalcanti conquistou uma posição única em nossa pintura contemporânea. Em nossa pintura brasileira”, disse dele Mário de Andrade “sem se prender a nenhuma tese nacionalista, é sempre o mais exato pintor. As coisas nacionais. Não confundiu o Brasil com paisagens: e em vez do Pão de Açúcar nos dá samba, em vez de coqueiros, mulatas, pretos e carnavais. Analista do Rio de Janeiro noturno, satirizador odioso e pragmatista das nossas taras sociais, amoroso e contador das nossas festinhas, mulatista-mor da pintura, este é o Di Cavalcanti de agora, mais permanente e completado”.
A observação de Mário de Andrade é exata. Nenhum outro pintor brasileiro chegou tão perto da nossa alma popular. A figura da mulata é símbolo da malemolência da nossa nacionalidade interpretada por um artista que amava viver em todos os sentidos. Sua obra abrange outros motivos, ao mesmo tempo brasileiros e cariocas, como o carnaval, os sambistas, as mulheres das noites da Lapa (famoso bairro boêmio carioca que inspirou inúmeros compositores), impregnadas de sensualidade. Como ele próprio afirmava “a nossa arte tem de ser como a nossa comida, o nosso ar, o nosso mar. Tem de ser reveladora de nossa cultura, pois a boa arte é sempre cultural, e sua dimensão própria é a de antecipar um momento cultural”.
Di Cavalcanti também foi um dos primeiros artistas nacionais a encarar o desafio do mural. Nesse particular foi influenciado pelos pintores mexicanos. Enquanto esses pintavam em função da Revolução Social Mexicana, que exaltavam social e politicamente, em grandes dimensões, Di Cavalcanti, ao contrário, derramava-se em brasilidade em temas que enfocavam, desde os nossos episódios históricos mais conhecidos, como A Chegada de D. João VI ao Brasil, às sensuais paisagens em que transmitia amor e admiração ao nosso povo e nossa gente. Mais Brasil, impossível.
Em campo oposto, o paulista nascido em Brodósqui, Cândido Portinari, é pintor respeitado e admirado nacional e internacionalmente.
Para isso muito contribuiu a força do seu desenho que, aliada à pintura e temas que são, na realidade, retrato sem retoque do homem brasileiro, Portinari com a dramaticidade de suas vigorosas figuras, obteve reconhecimento e acolhida calorosa interna e externamente que nenhum outro pintor brasileiro teve até à atualidade.
Nascido de pais italianos, menino pobre, logo se destacou pelo desembaraço com que encarava a arte, a ponto de ainda adolescente tornar-se auxiliar de um grupo de pintores de sua cidade, incumbido de decorar a Matriz de Brodósqui.
O passo seguinte de Portinari foi transferir-se para o Rio de Janeiro, então capital do país, em 1918, para freqüentar a Escola de Belas Artes, tendo sido seus professores Lucílio de Albuquerque, Rodolfo Amoedo e Batista da Costa. A partir de 1922, começou a participar do Salão Nacional de Belas Artes conquistando sucessivamente Medalha de Bronze (1923), Medalha de Prata (1925) e Grande Medalha de Prata (1927) merecendo, inclusive, fartos elogios do crítico e professor de história da arte, Flexa Ribeiro. No período, o retrato era o seu gênero preferido, com boa técnica, mas ainda com certo resquício acadêmico.
Com o Retrato de Olegário Mariano, poeta muito popular, obteve, em 1928, o cobiçado Prêmio de Viagem ao Exterior que o possibilitaria permanecer dois anos na Europa, durante os quais quase nada produz. Fascinado pelos grandes nomes da pintura, passa a maior parte do tempo indo a museus observando, anotando e, sobretudo, detendo-se na obra daqueles que mais admirava e com os quais sentia afinidades.
Antes da estada européia, Portinari tendia à linguagem acadêmica, mas retorna ao Brasil com a pintura totalmente reformulada. A influência dos grandes pintores mexicanos, Siqueiros, Rivera e Orozco, cuja obra mural repercutia mundo afora pela força da figura e da mensagem sócio política a serviço da Revolução Mexicana,provocou impacto na sua criação plástica. Sua primeira pintura mural data de 1936 para o Monumento Rodoviário, na antiga estrada Rio-São Paulo.
Convocado pelos arquitetos modernistas, à frente Lúcio Costa, Portinari pinta vários murais para o edifício do Ministério da Educação, que era um projeto ousado, inspirado nas idéias do francês Le Corbusier e marco da arquitetura moderna no Brasil. Em 1939, aceita convite do governo estadonovista encabeçado por Getúlio Vargas, através do seu Ministro da Educação, Gustavo Capanema, para realizar pinturas murais no Pavilhão Brasileiro na Feira Mundial de Nova Iorque.
O homem brasileiro, suas agruras, notadamente no trabalho, inspira ao artista uma série de telas captando-o principalmente no labor. Como observa o crítico José Roberto Teixeira Leite, os quadros “executados entre 1932 e 1939, formam a série marrom de Portinari. São obras de ambiências brodosquianas, visões de favelas e morros do Rio de Janeiro e composições com trabalhadores do campo, marcadas por um sentimento de calma monumentalidade que preludia o futuro muralista”.
Uma de suas mais conhecidas tela do período, Café, de 1935, conquista, nos Estados Unidos, menção honrosa em mostra de arte moderna promovida pelo Instituto Carnegie de Pittisburgh. A obra, hoje, faz parte do acervo do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.
A premiação abre-lhe as portas do país norte-americano, onde expôs individualmente várias vezes, inclusive a convite do governo para pintar murais na Biblioteca do Congresso, em Washington. Portinari firma seu nome nacional e internacionalmente e expõe em paises europeus e sul-americanos com enorme recepção da crítica. Na Bienal do México, em 1958, conquista o Prêmio Ciudad de México.
O conjunto de telas enfocando os retirantes nordestinos, cujo drama comovia o pintor desde quando ainda morava em Brodósqui, o inspira a realizar uma das mais contundentes series da pintura brasileira, ao mesmo tempo pintura na mais alta acepção e denúncia social das mais vigorosas já executadas por um pintor nacional.

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Como Portinari, o paraense Ismael Nery não participou da Semana de Arte Moderna de 1922. Considerado pelo crítico Antônio Bento, seu amigo, como “o pintor maldito da fase inicial do nosso modernismo”, Nery teve formação acadêmica no Rio de Janeiro - para onde se transferiu com a família quando contava com apenas dois anos de idade - na Escola Nacional de Belas Artes, que abandonou por causa da orientação acadêmica da Instituição. Durante sua primeira estada na França estudou na Academia Julian, em Paris, e conviveu com alguns teóricos de novas tendências artísticas, como o pintor Chagall e o teórico André Breton.
Místico, filósofo e poeta, Ismael Ney teve vida artística breve, como a sua própria existência. Suas pinturas e desenhos, com resquícios expressionistas, cubistas e surrealistas, o apontam como um artista brasileiro da época a estar conectado com os estilos em voga na Europa, principalmente depois de sua segunda viagem àquele continente, em 1927. O que queria dizer muito, porquanto a maioria não demonstrava nenhum interesse pelas sucessivas transformações pelas quais passava a arte, mormente numa cidade como Paris nos primeiros anos doséculo 20, aberta aos mais radicais ísmos que surgiam de maneira sucessivas nas artes visuais.
Assim, quando de regresso ao Brasil depois de sua segunda viagem a França, Ismael Nery introduz o surrealismo entre nós, sendo, portanto, pioneiro desse estilo onírico que fez a fama de pintores como De Chirico, Chagal, Salvador Dali e Max Ernest.
Pouco compreendida na sua época, inclusive por críticos e estetas, a pintura de Nery não teve a divulgação que merecia. Em vida, ele fez mostras individuais, em Belém e no Rio de Janeiro (1929). No ano seguinte expôs desenhos e guaches na Studio Nicolas, de conhecido fotografo carioca. Em todas elas com parcos resultados comerciais.
Primeiro pintor realmente voltado para o surreal no Brasil, Ismael Nery, era um figurativo nato, auto-retratava-se continuamente, unido seu perfil ao de sua mulher, a poetisa Adalgisa Nery, em pinturas carregadas de mistério e lirismo, o que o torna um dos nossos pintores mais originais.
Suas inquietações existenciais, porém, o levavam com freqüência à poesia e à filosofia em detrimento da pintura. Com o amigo e poeta Murilo Mendes criou as bases de uma doutrina filosófica, o Essencialismo, de fundamentos católicos.
Ismael Nery morreu com apenas 33 anos. Vida curta para quem a arte representava a sua própria essência. Muitos anos depois, a partir da década de 70, sua obra começou a ser estudada e avaliada pela crítica de arte e pelo público, que reconheceram o seu talento e valor como um dos mais importantes artistas da fase pós-moderna.

1930. INOVAÇÕES

Em 1930, o então ministro Gustavo Capanema, da Educação, nomeou o arquiteto Lúcio Costa, um dos responsáveis pela introdução da arquitetura moderna no Brasil, para a direção da Escola Nacional de Belas Artes.
Com o objetivo de renovar o currículo da vetusta Escola, mormente no que dizia respeito à Engenharia a fim de adequá-la à modernidade, uma de suas primeiras iniciativas foi contratar professores e arquitetos afinados com as novas tendências, como Leo Putz e Warchavchik, o último autor da primeira casa modernista do país, em 1927, em São Paulo, que causou celeuma nos meios intelectuais paulistas.
Lúcio Costa, que anos depois seria o autor do Plano Urbanístico da nova capital, Brasília, nos anos 50, levou suas inovações também ao Salão Nacional de Belas Artes, então conhecido como Exposição Geral de Belas Artes, certame existente desde os tempos imperiais e que tinha como sede o Rio de Janeiro, na época Distrito Federal, por ser a capital do país. Para começar, aboliu a premiação e convocou o poeta Manuel Bandeira, modernista e um dosparticipantes da Semana de 22, para presidi-lo, o qualdecidiu aceitar todos os inscritos sem seleção prévia, a maioria dos quais já voltados para o modernismo. Era a primeira vez que um fato dessa natureza acontecia no viciado Salão Nacional de Belas Artes.
Assim, pintores do Rio e de São Paulo, que antes não tinham chance no evento oficial - Tarsila do Amaral, Gomide, Ismael Nery, Flávio de Carvalho, Anita Malfatti, Vicente do Rego Monteiro, Portinari, Aldo Bonadei, Guignard, John Graz, Waldemar da Costa,Cícero Dias, Cardosinho, Lasar Segall, Vittorio Gobbis, dentre outros - participaram pela primeira vez do certame.
Como não podia deixar de ser, a gestão renovadora de Lúcio Costa mexeu com os brios acadêmicos. Professores, pintores e alunos do ensino tradicionalista, iniciaram forte oposição, inclusive convocando greve geral, o que culminou com o pedido de demissão do novo diretor.
Também conhecido como Salão Revolucionário pela ousadia e a confirmação dos valores modernistas em plena evolução, o evento e sua repercussão, segundo Rodrigo de Melo Franco de Andrade, “no computo geral, foi superior à Semana de Arte Moderna de 1922 no que diz respeito à consolidação do modernismo no Brasil”.

CONSOLIDAÇÃO DO MODERNISMO NO BRASIL

A semente moderna, pois, estava lançada. Embora não fosse unanimidade nacional, uma vez que suas principais metas foram boicotadas pelos acadêmicos, as idéias, contudo, demoraram a atingir as diversas regiões do país, embora houvesse uma consciência de mudança nos rumos das nossas artes plásticas e literatura. E isso motivava os jovens das províncias estaduais rumo às tendências estéticas que assolavam o Brasil.
No âmbito do Rio de Janeiro, artistas de uma segunda geração de modernistas, Orlando Teruz, Santa Rosa, Eugênio de Proença Sigaud e, principalmente, Alberto da Veiga Guignard, lutavam para impor novos conceitosestéticos à pintura.
Nascido na cidade fluminense de Nova Friburgo, Guignard teve educação artística esmerada, inclusive na Europa, naAcademia Real de Belas Artes de Munique, Alemanha.
Ao regressar definitivamente ao Brasil, em 1929, redescobre sua terra, “tomado de uma ternura e de uma admiração comovidas queconservou até seus últimos dias” - no dizer de Rodrigo de Mello Franco de Andrade. “O que contemplava e apreendia eram os aspectos empolgantes ou comovedores da terra em que tinhanascido, os traços expressivos de sua população, o pitoresco dascidades grandes e pequenas, as peculiaridades da vegetação, dos acidentes naturais, ocolorido das flores.”
No final dos anos 40 Guignard transferiu-se para Minas Gerais, fundou a primeira escola de arte de BeloHorizonte e, fascinado pelas paisagens de Ouro Preto,Sabará e Mariana, com suas montanhas e igrejasbarrocas, fez delas o motivo central de sua pintura.
Enos estados, os reflexos da Semana de ArteModerna,lentamente, vão envolvendo os artistas.
Em São Paulo, forma-se, em 1935, o Grupo Santa Helena, iniciado a partir do atelier do pintorFrancisco Rebolo Gonzáles, na sala 213 do Edifício Santa Helena, na Praça da Sé da capital paulista.Formavam ogrupo ospintores Mário Zanini, Clóvis Graciano,Manoel Martins, Fulvio Penacchi, Aldo Bonadei, Humberto Rosa, Alfredo Rizzoti. “Todospintando com idéias novas nacabeça,querendo fugir ao mau gosto e às deformações reinantes na arte e com uma vontade definitiva: estudar eaprender pintura”, como confessaria anos depois opróprio Rebolo.
No mesmo edifício, Alfredo Volpi desenha modelo vivo e passa a conviver com seus integrantes, aindadistante da linha, forma e cor que definiriam suapintura, posteriormente, voltada para as bandeirinhasfestivas e as fachadas de casas interioranas que sealternam e se multiplicam no espaço da tela. Tudotão plasticamente Brasil.
No Ceará, cria-se em 1941 o Centro Cultural de Belas Artes e nele desponta o pintor Antônio Bandeira (1922-1967), que de uma fase inicial de marinhas e paisagens, acolheria oabstracionismo após radicar-se em Paris.
Dois anos após, no Salão de Abril, surgem nomes como Aldemir Martins e Inimá de Paula, pintor mineiroentão radicado em Fortaleza.
Anos depois, em 1965, Aldemir Martins, conquistaria premiações consagradoras como desenhista de temasnordestinos naBienal Internacional de São Paulo (1955) e na Bienal de Veneza (1956), além de Viagem aoEstrangeiro no Salão Nacional de Arte Moderna(1959).
Em Pernambuco, juntam-se às expressivas contribuições de Cícero Dias e Lula Cardoso Ayres, as instalações da Sociedade Moderna do Recife, em 1950. Com elas, a revelação de artistas de grande garra criativa,como Reynaldo Fonseca e Francisco Brennand.
Na Bahia, artistas atuantes em Salvador, liderados pelo pintor Carlos Bastos, o tapeceiro Genaro de Carvalho e oescultor MárioCravo Júnior, iniciam a partir de 1944 a ofensiva modernista baiana que contaria depois (1949) com o apoio de Lygia Sampaio, RubemValentim, Carybé e JennerAugusto.
Esse último, sergipano de nascimento, deixara no mesmo anouma pintura decorativa no Bar Cacique, em Aracaju, marcandohistoricamente o modernismo em Sergipe.
No Rio Grande do Norte, em 1951, três artistas, Dorian Gray Caldas, Newton Navarro e Ivan Rodrigues promovem a primeiramostra moderna no Estado nos salões da CruzVermelha, em Natal.
No Maranhão, o Núcleo Eliseu Visconti, fundado em 1959 em São Luís, reunia artistas e intelectuais como Ferreira Gullar, LuciTeixeira, Floriano Teixeira, J. Figueiredo, LagoBurnett, Bandeira Tribuzi com o intuito de renovar as artes na capital maranhense.
No Paraná, em 1940, à frente o gravador Poty Lazzarotto, esboça-se a renovação da arte que culmina com a criação, emCuritiba,1948, da Escola de Música e Belas Artes e a conseqüente revelação de, dentre outros, o pintor Lóio Pérsio.
No Rio Grande do Sul, a fundação, em 1938, da Associação Rio-Grandense de Artes Plásticas Francisco Lisboa, em PortoAlegre, desponta o talento pictórico deCarlos Scliar.
Em Minas Gerais, em 1944, sob os auspícios da Prefeitura de Belo Horizonte e graças ao espírito empreendedor de Juscelino Kubistechek, então prefeito, realiza-se a primeira apresentação da arte moderna no Estado, ao meio de grandes controvérsias, intensificandoa presença deGuignard na cidade ea implantação oficial da arquitetura ousada de Oscar Niemeyer. Surgem os nomes dos pintores mineiros Mário Silésio e MariaHelena Andrés.
Enquanto isso, no Rio de Janeiro, funda-se o Núcleo Bernardelli, presidido pelo pintor Edson Motta, em 1931, com o objetivo de imbuir os integrantes ao modernismo, já que o ambiente artístico carioca continuavaestritamente ligado à Escola Nacional deBelas Artes, apesar dasnovas linguagens apresentadas no Salão de 1931.
Isso estava claramente explícito nas declarações de Edson Motta anos depois, segundo as quais os fundadores do Núcleo Bernardelli queriam “liberdade de pesquisa e uma reformulação do ensino artístico na Escola Nacional de Belas Artes e no Rio de Janeiro. A Escola constituía um reduto de professores reacionários, infensos às conquistas trazidas pelos modernos. Queríamos a renovação do ensino das artes plásticas”.
Além de Edson Motta, pintores e professores de renome exerceram a presidência do Núcleo Bernardelli, como Manoel Santiago e Quirino Campofiorito. Invés dos espaços limitados das salas de aula, os alunos pintavam ao ar livre, em praças e recantos cariocas, participavam de conferências, debates e salões de arte promovidos pela própria entidade.
Passaram pelo Núcleo, cujo nomehomenageava os artistas e professores Rodolpho eHenrique Bernardelli, que anos antes haviam manifestado publicamente repúdio à estagnação da arte e do ensino tradicional no Rio de Janeiro, Pancetti, Milton DaCosta, Joaquim Tenreiro, Roberto Burle Marx, Bustamante Sá, João José Rescalla, Rui Campelo, Takaoka, Cândida Cerqueira, Ado Malagoli dentre outros que fizeram a transformação da arte no âmbito carioca.
O Núcleo Bernardelli, que teve esse pioneirismo de proporcionar ao artista um contato de livre expressão com a natureza, manteve-se ativo até 1939, quando então seus discípulos se dispersaram, muitos deles já participando ativamente de salões de arte oficiais e particulares obtendo significativas premiações. Conseqüentemente, firmando-se na arte brasileira.

MUSEUS DE ARTE MODERNA. A BIENAL DE SÃO PAULO

Importante acontecimento para consolidar o modernismo no Brasil seria a fundação, nos anos de 40, do Museu de Arte de São Paulo (1947), iniciativa do jornalista Assis Chateaubriand, do Museu de Arte Moderna de São Paulo (1948) e do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (1949).
Museus que na verdade não eram apenas repositórios de telas, esculturas, desenhos e gravuras, mas onde se podia debater, aprender e, obviamente, ver arte, como um centro integrado de cultura, dentro dos conceitos museológicos que se iniciavam no Brasil. Principalmente procurava-se definir o que era arte brasileira e a sua identificação com a cultura do país.
Mas se o Brasil já estava sob a égide do modernismo, faltava a sua integração às linguagens contemporâneas, desenvolvidas principalmente após a Segunda Guerra Mundial, que praticamente arrasou capitais intelectualmente irradiadoras de arte, como Berlim e Paris.
A I Bienal Internacional de São Paulo, inaugurada em 1951, veio suprir a lacuna, reunindo na capital paulista pintores, desenhistas e escultores contemporâneos, ao mesmo tempo que proporcionava ao artista brasileiro visão abrangente das linguagens recentes então em voga em centros culturais do “primeiro mundo”, como Londres, Tóquio e Nova Iorque.
Considerada uma das mais importantes bienais do mundo, ao lado da Bienal de Veneza (criada em 1895), o certame brasileiro nasceu sob os auspícios do industrial e mecenas Ciccillo Matarazzo como desdobramento das atividades do Museu de Arte Moderna de São Paulo.
Na sua primeira versão, na Bienal Internacional de São Paulo figuravam nomes da mais alta significação da arte - Picasso, Fernand Léger, George Rouault, Feininger, Alexandre Calder, Tolby, Lipchitz, Carlo Carra, Magnelli, Ben Nicholson, Campigli, Morandi, Suherland e Marc Rothko.
A representação brasileira contava com Maria Martins, Emiliano Di Cavalcanti, Bruno Giorgi, Cândido Portinari, Lívio Abramo, Lasar Segall, Vitor Brecheret e Oswaldo Goeldi, todos, com exceção da escultora Maria Martins, figurativos na mais alta acepção. Aos veteranos juntaram-se jovens e promissores artistas, tais quais Ivan Serpa, Abraham Palatnik (com objeto cinético, ou seja, arte em movimento), Geraldo de Barros e o naif Heitor dos Prazeres. O Prêmio de Melhor Pintor Brasileiro ficou com Danilo Di Prete.

ABSTRACIONISMO

Abria-se o Brasil ao abstracionismo formal e informal, afastando a pintura cada vez mais da realidade.
A escultura Unidade Tripartida, do suíço Max Bill, laureada na I Bienal Internacional de São Paulo, instigou os brasileiros, que pela primeira vez entravam em contato o concretismo, ao rigor formal e a uma tendência em que “a pintura basta-se a si mesma, com elementos puramente plásticos”, cuja influência ramificou-se por boa parcela deles. O movimento concreto nacional aliava a poesia à arte e ao design.
Como queriam os artistas e poetas paulistas Waldemar Cordeiro, Hermelindo Fiaminghi, Judith Lauand, Sacilotto, Mauricio Nogueira Lima, Lothar Charoux, Alexandre Wolner e os irmãos Haroldo e Augusto de Campos, o movimento realizou mostras em São Paulo e no Rio de Janeiro agrupando artistas das duas capitais.
Os cariocas, porém, logo romperam com os paulistas e lançaram o Manifesto Neoconcreto em 1959, no qual figuravam, liderados pelo poeta Ferreira Gullar, Amílcar de Castro, Lygia Pape, FranzWeissmann, Ivan Serpa, Theon Spanudis, Reynaldo Jardim. A lista seria acrescida com a adesão de Hércules Barsotti, Osmar Dillon e Willys de Castro.
O Neoconcretismo, dizia o manifesto, “indica uma tomada de posição em face da arte concreta levada a uma perigosa exacerbação racionalista”.
O Concretismo e o Neoconcretismo preparavam o Brasil para as próximas investidas em arte, agora bem fundamentadas para enfrentar os novíssimos desafios que despontariam no final do século 20 e início do seguinte.

Por Geraldo Edson de Andrade In http://www.raulmendesilva.pro.br/home01.shtml


3 comentários:

  1. Este texto fala de quando iniciou-se a Arte moderna,que revolucionou todo o conceito que existia sobre a Arte.Além de mostrar a grande diferença entre o modernismo,que enxerga a Arte através da espiritualidade e dos Acadêmicos, que defendem a estética como representação da Arte.No texto há algumas citações de revolucionários da Arte e seus estilos e formas.Alguns quadros belíssimos.

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  2. adorei é muito interessante a historia.

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  3. Olá, querido Hebert adoro olhar seu blog.Jamais o esquecerei,lembro de quando dançamos naquele encontro de professore fizemos o show.

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